Esperançar na educação para vencer o ciclo da pobreza

Cinco anos depois, Yasmin continua na escola. Encontrada pela BAE em 2018, a menina e seus irmãos estão rompendo todo um ciclo de analfabetismo e exclusão

Esperançar na educação para vencer o ciclo da pobreza

Eram seis e quinze da manhã e o Sol aparecia enfrentando a neblina para clarear a vegetação no entorno da casa de Yasmin dos Santos, no povoado Lagoa do Saco, na zona rural do município de Euclides da Cunha, na Bahia. Como em diversas manhãs, Yasmin tomava café e se preparava para mais um dia de aula. "Eu acordo e escovo os dentes, me arrumo para ir para a escola. O ônibus, ele me pega e leva para a escola", conta. A menina, hoje com 9 anos, começou a estudar aos 4, após a equipe da Busca Ativa Escolar identificar que ela já estava em idade escolar e encaminhar sua matrícula para a escola mais próxima do povoado.

A aridez do clima e da resistência à pobreza não deixaram de existir, cinco anos depois, mas muito da vida e da rotina de Yasmin mudou nesse período. Hoje, ela cursa o 2º ano do ensino fundamental na Escola Municipal Luiz Valeriano Dias, onde está aprendendo a ler e a escrever. "Eu sou a primeira a entrar na sala", conta Yasmin, confessando que gosta ainda mais "de fazer os números" do que as letras.

"Ela está aprendendo, e eu fico alegre. Ela estuda para ser alguma coisa na vida, para ter o que a gente nunca deu. (...) A gente, sem o estudo, não é ninguém. É surdo, cego e mudo", diz Simone dos Santos, mãe de Yasmin, num misto de pesar e esperança. O ciclo da exclusão escolar e social acompanhou sua vida e a vida de sua mãe, Silvana Maria de Jesus. Ambas não chegaram a se alfabetizar. Por outro lado, Yasmin e todos os seus quatro irmãos – Mikaelly, Nicole, Luciene e o caçula, Gustavo – estão na escola e podem ser a geração capaz de quebrar esse ciclo.

As crianças não deixaram de se matricular nem mesmo na pandemia, quando a evasão e o abandono escolar atingiram os maiores índices das últimas décadas no Brasil. A diretora da escola em que Yasmin estuda, Marly Matos, explica que a dificuldade nesse período foi muito grande para a escola, que atende majoritariamente uma área rural, de difícil acesso a celulares e baixa cobertura de internet. "Mas nem por isso eles deixaram de participar", conta. Para garantir a participação, a equipe pedagógica realizava um plantão na escola todas as segundas-feiras, para que pais, mães e familiares dos estudantes sem acesso à internet pudessem buscar as versões impressas das atividades da semana e deixar a produção dos filhos da semana anterior.

Marly foi a responsável pela identificação do caso de Yasmin, em 2018, juntamente com Lucijane Neves, coordenadora operacional da Busca Ativa Escolar no município. Desde então, as duas acompanham de perto a trajetória da menina, e dos irmãos dela. Marly conta que a princípio, Yasmin não conseguia manter a assiduidade necessária. "Mas, depois que a gente começou a conversar, que a Busca Ativa foi lá, que a gente falou sobre a importância, ela começou a vir. Este ano mesmo, ela está frequentando e não falta nenhum dia", revela a diretora, comemorando o fato de que ela vem desenvolvendo significativamente suas habilidades educacionais, especialmente a partir de 2023.

Realidade em 2018

UNICEF/BRZ/Diego Souza

Educação, desigualdade e intersetorialidade
A Busca Ativa Escolar é uma estratégia desenvolvida pelo UNICEF e Undime para apoiar os governos na identificação, registro, controle e acompanhamento de crianças e adolescentes que estão fora da escola ou em risco de evasão. Para que ela seja efetivamente implementada, é fundamental compreender os motivos que levam à exclusão escolar, caso a caso, de modo que sua abrangência não se restrinja apenas à garantia do acesso e permanência na escola, mas à articulação de políticas públicas integradas que possam enfrentar os motivos que levam à exclusão escolar.

Em muitos casos, essa raiz está relacionada à vulnerabilidade social. Na Bahia, 77 de cada 100 crianças e adolescentes vivenciam as consequências de uma um mais dimensões da pobreza, sendo a privação de renda a dimensão que mais os afeta, impactando 57% das meninas e dos meninos, de acordo com a pesquisa "As Múltiplas Dimensões da Pobreza na Infância e na Adolescência no Brasil".

Realidade em 2023


Por isso, não foi apenas pelo direito de estudar que a vida de Yasmin foi impactada. Ao ter seu caso registrado na Plataforma da Busca Ativa Escolar, ela e sua família passaram a ser acompanhadas por equipes das Secretarias Municipais de Saúde, Educação e Assistência Social de Euclides da Cunha. Por meio de estudos socioassistenciais que mapearam a situação da família, ela foi inserida em programas e benefícios, a exemplo do Bolsa Família e do benefício eventual de alimentação, que contribui com a segurança alimentar de Yasmin e de seus irmãos.

"O trabalho intersetorial é de extrema importância para nosso município. As Secretarias de Educação e Assistência Social permanecem fazendo o acompanhamento da família até conseguirmos nosso objetivo, que é manter a criança na escola e sendo atendida para evitar outras vulnerabilidades", avalia a secretária de Assistência Social de Euclides da Cunha, Maria das Dores Nascimento de Melo.